quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Prelúdio

Nada disse. Reparei. Olhei. Fitei. Tinha belos olhos. Ora arregalava-os, como quem estava sem seus óculos. Ora recolhia-os, não sendo mais necessário visualizar seu entorno. Olhos bastante conhecidos. Olhos que pareciam cumprimentar a todos como um velho prefeito de cidade pequena. "Seja bem-vindo" - diziam-me, os olhos.

Não era do tipo tagarela. Era afetuosa, expontânea. Vez ou outra explodia em movimentos bruscos. Assim eram seus abraços que, mesmo sem razão evidente de existir, entregavam-se. É o tipo de abraço que transmite uma energia entre as epidermes que se chocam. Deixando a pele marcada, deixando cheiro, rastros de vivacidade. Quando falava, era ligeira. Se existiam vírgulas, eram grudadas às palavras.

De cá, eu procurava uma brecha que abreviasse meu desejo: uma medida, uma concordância verbal, uma angulação, até um cílio mais levantado que os demais. Ao reparar minha inquietude, ela me sorriu. Sorriu, assim, sem finalidade. E o meu mundo - ah, o meu mundo... - nunca mais foi o mesmo.

segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Enquanto Chovia

Saí eu de uma festa, animado. Mas a chuva que caia do lado de fora insistia em gelar minha alma. Me despedi de duas amigas que comigo se aventuraram. Fiz sinal pra um táxi que passara. E ele... passara. Fiz sinal pro próximo. Abri a porta e sentei no banco do carona - não faço esse tipo que senta no banco de trás, com ar pomposo e cheio de si. Gosto de sociabilidade.

- Essa chuva é bom pra chegar em casa e dormir com aquele barulhinho, né? - Puxou conversa o que sentava à esquerda.

- Exato. Hoje em dia existem uns sites que simulam esse som da chuva. Mas o bom é o natural mesmo. E na minha rua ainda tem aqueles gatos que miam a noite toda. Em dias chuvosos eles somem.

- Ah, minha mulher tem um gato.

- E você gosta?

- Gostar dele, eu gosto. Mas não sei se a recíproca é verdadeira.

- Gatos...

- É, eu gosto de passarinhos. Tenho um trinca-ferro que canta que é uma beleza nas manhãs de sol. - Pensei: "Quem gosta de passarinhos não os tem". Mas não quis entrar nos meus idealismos naquele momento.

- Deve ser bonito de se ouvir.

- Esse sinal aqui é meio chato... - murmurou - Mas e a festinha que você tava? Muita menininha?

- Ih, cara. Tem casos onde é melhor ter uma só. Mulher já é bicho perigoso. Juntando muitas no mesmo lugar então...

- Isso é verdade. "Ter uma só", então você é do tipo que prefere namorar. Com essa idade? Tá fora da crista da onda. - Disse, usando uma gíria fora da crista do século.

- Não, na verdade não. Apesar de meus namoros terem sido razoavelmente longos. Eu prefiro estar com alguém do que ter alguém. "Ter" é de uma sensação de posse, definida conforme o desenvolvimento dessa sociedade materialista que nos encontramos, que eu não admiro. "Estar" é de uma sensação de companheirismo, cumplicidade, é não estar acima ou abaixo, é estar ao lado.

- Gosto da sua dialética! Você deveria escrever essas suas engenhosidades. Já pensou em ter um blog? Meu sobrinho tem um que ele escreve umas coisas, mas não entendo muito bem disso não.

- Blog? Eu? Não. Sou muito intimista. Me sinto exposto, ainda que de uma forma segura, quando alguém me lê.

- Vou ligar uma música. Quer ouvir música?

- A conversa está agradável, pra mim está bom só com o barulho da chuva.

- Então tá ok!

- A próxima saída da Linha Amarela, heim!

- Conheço esse Rio de Janeiro de cabo à rabo, meu amigo, pode deixar. - ofendeu-se.

- Mas voltando a falar de mulheres. Estou em uma enrascada daquelas, amigo...

- Ih! Já vi tudo!

E a conversa intimista continuou de um modo complacente. E continuou. E continuou... Até que eu paguei a corrida. Houve um aperto de mãos. Saí do carro amarelo e azul pro meu portão de cor verde. Ao adentrar em casa, concluí: "Que engraçado esses psicólogos que fazem bico de taxista".

quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Toque

Carolina toca flauta
Melódicas canções
Ela me toca, falta
Ar nos meus pulmões

Mariana toca violão
Empolgada! Uma louca!
Ela me toca, faltam
Palavras na minha boca

Teresa toca zabumba
Mais uma de suas belezas
Ela me toca, surgem
No estômago, borboletas

De cá, suspiro, me atento
A ouvir com exaustão
Se é batuque, corda ou sopro
Que faz dançar meu coração

segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

A Revolta dos Bichos

O que se passa?
O que se passa?
Questionou a garça

Passatudo
Passatudo
Disse o guaxinim

- Foi o primeiro assalto na história da floresta.