sexta-feira, 10 de maio de 2013

Uma Crônica sobre Soluço, Simpatia - Um Pequeno Comentário sobre Quem Toca Legião Urbana em Roda de Viola - Pink Floyd, Flash, Alienígena, Collant e Dívida - Necessariamente Nesta Ordem


- Fade in -






- Ic! Ic! Ic...

Fazia mais de duas horas que soluçava. Não conseguia parar! Não conseguia dormir! Lembrei de uma simpatia antiga de colocar um papelzinho na testa. 

- É isso! - ecoou em minha mente. 

Num quarto escuro como noite sem luar, estiquei minha mão direita pro criado-mudo - que ainda que não fosse mudo, não teria muito o que dizer de mim, era minha primeira noite na cidade - e apalpei o que parecia ser um pequeno papel. Sem muita certeza, coloquei na língua e logo na testa.

Senti um certo sabor ao colocar na língua, mas devido ao forte tempero do jantar daquela noite, não me deu pra diferenciar muito. Pensei ser um daqueles chicletes que parecem papel arroz e aderem à boca. Cinco minutos de papel na testa e o soluço de mais de duas horas acabara. Sem pestanejar, chiclete na boca. 

Eu havia marcado de encontrar uns amigos pra fazer uma fogueira e tocar uma viola e, naquela de sempre, falar que tava desanimando a galera quando alguém puxasse Legião Urbana. 

Acendi a luz. Fui ao banho e vestir-me, necessariamente nesta ordem. Já pronto, esperei 20 minutos pra ficar compatível com o horário de chegada de todos. Passados os minutos, parti ao encontro dos cretinos.

No meio do caminho, me senti estranho, como se meu corpo estivesse levando pequenos choques e meus músculos enrijecendo em alguns espasmos. Jurei beber menos café, me pareceu excesso de cafeína. 

Lá fui eu andar pela primeira vez na madrugada de tal cidadezinha. Devia haver uns 7000 habitantes lá. A partir de um tempo andando, comecei a achar que errei o caminho. Não me fazia mais sentido as ruas. Ah, importante dizer que estava ouvindo "The Dark Side Of The Moon", no modo aleatório, com o fone de ouvido, diretamente do meu humilde celular. Quando constatei que estava perdido, estava tocando "Brain Damage" - "the lunatic is in my head..." - o que me pareceu sarcasmo do destino.

Enfim, não encontrava uma alma viva no meio das ruas que me enfiei. Fui tentando descobrir o caminho do meu jeito, não sei se por intuição, guiando-me pelas estrelas ou simplesmente andando pela vontade de andar - como eu estava com vontade de andar!

Em algum momento parei para admirar o céu. As nuvens passavam em formas diversas. Via cardumes, palafitas, rolos compressores... Por um instante eu pisquei, e quando abri o olho novamente, um flash me atingiu de cima! Não entendi bulhufas! Máquinas fotográficas no meio do nada?! Não me parecia coerente. Por uns segundos fiquei atordoado, até me deu vontade de sentar até recuperar a normalidade da visão, mas aguentei firme em pé.

Ao recuperar, olhei pra tudo que é canto e não tive a menor ideia de onde veio o tal flash. O que me assustou, resolvi andar no sentido contrário que ia, cada vez mais rápido.

Alguns minutos depois, com o coração acelerado, subi uma calçada com um grande muro de granito à direita - meus olhos só fitavam a calçada, como um cão assustado.

Quando enfim tive coragem de levantar o rosto, deparei-me com uma criatura magra de olhos vermelhos e arredondados com - sei lá - um metro e oitenta cinco de altura. Me acenava com três dedos! 

- FUDEU! UM ALIENÍGENA! - este pensamento me atingiu a cabeça como um raio!

Peguei o primeiro rumo à esquerda e corri que nem jamaicano de collant amarelo e verde!

Logo identifiquei que era o caminho da minha pousada. Corri ainda mais rápido. Passei pela recepção. Subi as escadas que rangiam. Entrei no quarto com toda pressa, tive nem problemas em acertar a fechadura. Ao fechar a porta, meu amigo que me trouxera à cidade e dividia o quarto comigo tomou um susto.

- Cara, que houve? Tu tá pálido!

E eu tomei um susto maior ainda! Que se o soluço não tivesse passado até aquela hora, iria passar certamente nesse susto!

- E você?! Não combinamos de nos encontrar no bar?!

- Sim! Combinamos! Mas ainda faltam vinte minutos. Vim tomar um banho e me vestir pra ir. - necessariamente nesta ordem.

Olhei no relógio e, realmente, ainda faltavam vinte minutos! No dado momento, começa a tocar "Time" no fone direito - o esquerdo eu havia deixado pendurado na camisa, para melhor dialogar.

- Não é possível! Horas atrás eu estava com soluço! Fiz a simpatia de colocar o papelzinho na testa! Que eu ainda não sei se é chiclete... Mas funcionou! Aproveitei o fim do soluço para tomar um banho e me vestir. - necessariamente nesta ordem - E aí já faltavam vinte minutos! - enquanto eu me exaltava no discurso, o ouvinte da cena estava quieto debaixo do chuveiro do outro lado da porta - Fui para o bar! Errei o caminho! Me perdi! Teve um grande flash na minha cara no meio do porra nenhuma! Fiquei assustado e corri! Bati de frente com um alienígena! Agora eu tenho certeza que aquele flash era a nave...



Enfim ele iria me interromper:



- Você reparou que tinha uma estátua de alienígena no centro da cidade quando viemos, né?

Eu havia reparado! Mas no calor do momento tivera eu esquecido. Me pareceu coerente o que insinuara. Resolvi aceitar tal suposição vinda da parede fina que separava o banheiro e o quarto como verdade.

- Ih.... É mesmo! - respondi assim, mas acho que ainda havia uma pequena parte de mim que acreditava em algum tipo de abdução. - Eu tenho cada uma!






- Fade Out-








Cinco segudos, conta aí.






- Fade in - 






- Ei, cara! O papelzinho que você achou que era chiclete... Estava em cima do criado-mudo?

- Sim.

- Você mascou depois?

- Aham.

- Ok. Me deve 30 reais.






- Fade out -

2 comentários:

Izadora disse...

Adorei! Devia escrever mais cronicas :)

Anônimo disse...

Muito bom! Gostei de crônica e também acho que deveria escrever outras ;)