A lua já se fazia soberana no céu. O despertador já era programado pela maioria das pessoas. Bêbados e boêmios cantavam sambas que o tempo tentava apagar da memória popular. Estava eu em meu aconchegante recanto, cansado, porém era algo que minha visão não queria negar.
A pouca incidência de luz, oriunda do poste mais próximo, deixava um brilho estrelar na silhueta ainda visível. A respiração leve e ritmada, como um tango antigo, fazia seu corpo extender e recolher de um modo que me confortava estar ali. Os fios de cabelo cobriam levemente a maçã do rosto, como folhas que tentam esconder a mais doce fruta. Pálpebras imóveis, como se anjos as acariciassem e as mantivessem calmas. Um corpo que parecia esperar por acalanto, um filhote longe da ninhada, contraído, como se buscasse calor no vento da madrugada. As velas, ainda que apagadas, velavam sua alma, esta, acesa.
Regressava eu da boemia, embriagado sentava na poltrona frente à cama. Admirava o mais belo quadro da pinacoteca do meu desejo. E ali, estático, ele era belo. E, simplesmente, dormia.